Estava eu toda lampeira no comboio de volta de Glasgow, depois de me ter ido despedir da minha cara-metade (Que de vez em quando usa saias... Começo a achar que as usa mais vezes que eu...), quando recebo um telefonema dele. Pensei logo: “Ainda não foste embora e ele já está cheio de saudades! Que romântico!”
Ele: “Porcotte, não sei como te dizer isto, e não estou a gozar... Vais pensar que estou, mas não estou!”
Eu já a pensar: “Sacana, queres ver que já houve merda? Que raio é que já fizeste, meu ranhoso?”
Ele: “Olha Porcotte, a maioria dos voos para Heathrow foram cancelados...”
Eu a pensar: “Quê, mais uma ameaça terrorista? Mas esta gente não tem mais nada que fazer? Ou este gajo está a gozar com a minha cara?”
Ele: “É devido ao nevoeiro! Está muito denso e andam a cancelar os voos internos todos e alguns internacionais!”
Porcotte quase que desmaia, sobretudo porque ia voar para Heathrow no dia seguinte, por forma a vir comer o peru, o bacalhau e as morcelas à sua querida terra natal! A família é secundária. O importante mesmo é a comida!
Desato aos berros histérica no comboio: “E agora, como vou para casa? O que raio faço? ARGH! Dôr, sangue, morte!”.
Ele acalma-me, como sempre faz, e diz que quando eu chegasse a casa, que ele me dava o número da companhia e eles logo diziam o que fazer. Mas que se acontecesse o pior, tinha sempre com quem passar o Natal.
O resto do caminho vou a amaldiçoar tudo e todos e à maldita hora que comprei bilhete para dia 21 de Dezembro, e à maldita hora em que existe Natal, e à maldita hora em que nasci. Maldita!
Chego a casa, depois de telefonar para casa e pôr a família toda em pulvurosa, e lá telefono para a companhia. A senhora era mesmo amorosa e muito prestável e lá consigo um voo às 7.30 da manhã para Londres. O voo para Lisboa era às 3.30 da tarde. "Porra, vais apanhar uma linda seca no aeroporto, minha besta. É para não seres parva!"
No dia seguinte, depois de ter dormido muito bem (tom de sarcasmo), levanto-me às 4.30 da manhã, apanho um táxi às 5.30 da manhã e chego ao aeroporto às 5.50 da manhã. Faço o check in depois de alguma confusão e espera, e vou esperar sentada pelo meu voo. Ás 7.30 da manhã ouço a última chamada do voo das 6.30 da manhã para Londres (os voos não estavam atrasados nem nada...) e de repente ouço o meu nome...
“ULTIMA CHAMADA DA BRITISH AIRWAYS PARA LONDRES HEATHROW. Passageiros x, y, e Porcotte Pink é o favor dirigirem-se ao gate 11”.
Porcotte acha que ouviu mal... “MAS então...? Este não é o meu voo!”. Dirijo-me para a porta 11, pergunto que raio se passa e informam-me que mudaram o meu voo para o das 6.30 (na realidade ja eram 7.30... Confused? Eu também ainda estou um bocado....), sem me avisarem de nada. Entro a correr no avião, histérica e descontrolada já com tanta mudança e confusão. Outros não tiveram a mesma sorte que eu de ouvir o anúncio e ficaram em terra... No caminho servem um pequeno almoço todo catita: ovos, bacon, salsicha, tomate, cogumelos e sumo de laranja! Um festim. Eu que não estava agoniada dos nervos nem nada, soube-me que nem ginjas...
Porcotte chega a Heathrow... Um nevoeiro mais denso que eu sei lá o quê. Só vi a pista quando saí do avião e meti os pés em terra... Não se via a ponta dum corno!
Nunca na minha vida vi uma confusão tão grande num terminal. Milhares de pessoas, descontroladas, aos berros, aos insultos. Deve ter havido porrada pela certa às tantas, ou o meu nome não é Porcotte Pink.
Porcotte acagaçada, com medo de que o voo dela para Lisboa fosse entretanto cancelado, porque por sorte, ainda não tinha sido, mete-se na bicha da BA. Era assim uma bicha piquena... Assim de uns poucos milhares de pessoas... À sua frente estava um casal de italianos que tinham tido o voo da véspera cancelado e estavam furiosos porque ninguém lhes dizia nada. Imaginem: dois italianos e irritados... Não é bonito de se ver... Ainda bem que o pai de Shoo me ensinou uns quantos palavrões em italiano, que foi da maneira que percebi a conversa quase toda.
Passa uma gaja da BA por mim e eu chamo-a e explico a minha situação: “Pá e tal, o meu voo não foi cancelado e tal, pelo menos ainda, acho eu, nem sei, o que raio faço? Fico nesta bicha?”
“Esta bicha é só para quem tem os voos cancelados, tem é que ir para uma tenda que está lá fora e esperar. Quando tivermos informações sobre o voo, damos”.
“Então mas quer dizer, se o meu voo for cancelado entretanto tenho que voltar para esta bicha, certo?”
“Sim...”
“Ahhhhh... Muito bom...”
Silêncio desconfortável... Porcotte vai para a tenda, ainda mais irritada, se é que isso era possível.
Uma tenda branca. Enorme. Gelada. Com cadeiras de plástico. Mantas. Pessoas tristes. Desanimadas. Com caras de enterro: porque será?
Porcotte ocupa uma cadeira. Vai depois buscar um chá e uns biscoitos que estavam a dar para ver se aquecia. Volta para a cadeira. Depois de 5 segundos sentada, começa a morrer de frio e enrola-se numa manta. Mais pessoas se sentam ao pé dela. Começam as conversas, troca de impressões e ideias. Experiências vividas ali. Enfim, o costume! Desgraçados sozinhos como eu eram aos molhos!
Ás tantas telefonam a Porcotte. Era seu pai: “Então? Como estás? O Visque, não se partiu, não?”
Uma família de americanos chega-se ao pé de Porcotte e pedem o telemóvel para telefonar para a agência na Suiça, e que obviamente pagavam o telefonema. Porcotte dá o telemóvel com pena, e eles em troca queriam dar 20 euros. Porcotte não quer aceitar, e diz que não, que é muito dinheiro, mas eles metem o dinheiro no colo de Porcotte, dizem: “É Natal!”e vão-se embora.